Há um mês, os números oficiais revelaram que havia em Portugal mais idosos a morrer por problemas de saúde do que seria suposto nesta época. António José Seguro, que não percebe nada de medicina mas percebe muito de demagogia, foi rápido a culpar as políticas económicas do Governo: “Se é normal para o senhor secretário de Estado da Saúde haver este número anormal de mortes em Portugal, eu não compreendo. (…) Há especialistas que já vieram dizer que o número anormal de mortes não se deve apenas à questão dos vírus, que são normais nesta altura do ano, e que pode estar associado a outras razões, designadamente de natureza social e económica.”
Jerónimo de Sousa, que ao que consta também não tirou o curso de Medicina, foi ainda mais direto: “Quero aqui fazer uma afirmação que é simultaneamente uma acusação. Aquilo que se está a fazer no plano da saúde, particularmente aos mais idosos, negando-lhes a possibilidade de transporte, negando-lhes a possibilidade de uma consulta atempada, de um exame atempado, responsabiliza este Governo pela morte antecipada de muitos portugueses, particularmente de idosos.”
Era uma tese interessante: enquanto salivavam a pensar nos lucros do grande capital às custas dos sacrifícios do proletariado, a troika e o neoliberalismo tinham decidido, sem nenhuns remorsos, condenar à morte os idosos portugueses. O Governo, com a sua reconhecida falta de humanidade, era culpado de homicídio económico.
O único problema com esta teoria são os factos. Segundo um estudo recente do Centro Europeu para a Prevenção e Controlo de Doenças, houve mais 11 países além de Portugal com “excesso de mortalidade” em pessoas com mais de 65 anos. A culpa não é da crise, é da gripe. Os especialistas explicaram que, nos últimos dois anos, a estirpe H1N1, que afeta sobretudo jovens, foi a dominante — enquanto em 2012 a estirpe dominante passou a ser a H3N2, que ataca especialmente os idosos.
Um outro número iliba definitivamente a troika: em Portugal (e em Espanha e na Bélgica), houve no total mais mortes de idosos durante sete semanas, mas na Irlanda e na Grécia (que também estão sob intervenção externa) esses números anormais duraram apenas uma semana.