A PEDAGOGIA DO MEU (NOSSO) CONTENTAMENTO

Verifico com relativo agrado e até alguma desconfiança, que Portugal caminhou a passos largos para ser um dos melhores ao nível mundial no seu ensino oficial. A fazer fé nos resultados das mais recentes estatísticas revelados pela OCDE, estamos no bom caminho, felizes com o reconhecimento de que os nossos laboriosos infantes subiram uns patamares numa escala que o País se encarregou, laboriosamente, de falsificar com antecedência. Parece que os chumbos nas escolas são menos…e isso parece-me natural: os nossos alunos (muitos) não sabem soletrar as tabuadas e mesmo assim passam de ano, estando alguns (às vezes parece-me…) a caminho de um mestrado ou doutoramento aos dez ou onze anos. Antigamente, naqueles tempos “miseráveis”e comandados por senhores omnipresentes (é o que dizem os actuais governantes) saber ler, escrever e contar eram etapas fundamentais na vida de qualquer jovem e adolescente .O meu “velho Mestre”-prof.Albano e o de muitos leitores certamente, que provavelmente se encontra num lar de idosos, preocupava-se na construção de princípios e valores, assim como na formação pura e dura, fora de interesses particulares e na construção de gerações articuladas no equilíbrio e no saber.
Ai de quem de nós não soubesse enumerar três ou quatro reis da 1ªdinastia e não distinguisse os Afonsos dos Sanchos, escrever um ditado sem ser humilhado pela quantidade de erros ortográficos, fazer uma “redacção”sobre as estações do ano, descobrir uma prova real a partir de uma operação de multiplicar ou dividir e saber distinguir um cubo de uma pirâmide de Gizé…E tudo isto acompanhado tantas vezes, por “tabefes”e “responsos”que afinal nunca nos traumatizaram…
E as nossas saídas para o campo, sempre com a bola de futebol a acompanhar-nos. Esses eram os nossos momentos mágicos, pois uma hora bem suada no velhinho campo de S.António, valia por todos os recreios da semana…não sem antes, entre o tojo e o rosmaninho “aprendermos” e o “Mestre”fazia questão, de nos mostrar os picos do Caramulo, as diferenças das árvores, a orientação pelo astro-rei, a sagacidade da raposa e a rapidez do lagarto…entrecortado aqui e além por Camões, Eça ou Aquilino.
Sei, como pedagogo que o sou, que não devia ocupar-me destes assuntos. O País passa muito bem sem ter que se preocupar destas minudências. Interessam antes as estatísticas. Estas, que como disse uma vez para mim o irmão do Dr.Simões Pereira de Meruge (aquando de uns trabalhos estatísticos que fiz por volta dos anos 80…):
-“ Sabe meu rapaz! Há dois tipos de mentira-a mentira p.dita e a Estatística…”.Dessas palavras eu nunca mais me esqueci e é por isso que não confio nada nesses resultados. Porém e o mais chocante não é a irrelevância das mesmas, mas antes o contentamento de ministros, directores, educadores e um sem número de “parasitas políticos”por saberem que a ignorância foi festejada com louvor estrangeiro e com aquela selvagem inconsciência que se espelha nas suas declarações sorridentes.

Convenço-me pois –embora desconfiado- que o País vai bem, estimável e pacóvio. O velho António Campos,meu pai,considerava que a minha educação e a de meus irmãos (éramos oito) competia à ordem estabelecida dentro de casa. Bastavam regras rígidas, possuir carácter e fossemos deixados ao livre arbítrio das coisas- mas que aprendêssemos ao menos a fazer  contas…
Ora, o que mais me custa é perceber que o Estado do meu tempo de miúdo não foi sério no reconhecimento daqueles que sustentaram Portugal e que ainda hoje, essa é uma história que se repete interminavelmente até que alguém ponha cobro nas urnas a tais abusos de prepotência. Actualmente e para alguns governantes,os professores são apenas um número, porque os critérios de qualidade foram ultrapassados pelas estatísticas que interessa mostrar em reuniões e simpósios exibicionistas onde os governantes debitam e o poviléu absorve…
 
A.M.Campos